O dólar vem se valorizando consideravelmente em relação ao real nas últimas semanas devido, principalmente, a incertezas políticas e econômicas nos mercados nacionais e internacionais em decorrência dos efeitos do Corona vírus, ao baixo crescimento da economia brasileira e as constantes reduções na taxa de juros no Brasil. O cenário de incerteza faz com que os investidores busquem ativos mais seguros, como o dólar e o ouro. O baixo crescimento da economia brasileira diminui a confiança para investimentos internacionais no país. A redução na taxa de juros faz com que investidores busquem mercados mais atrativos para aplicarem seu dinheiro. Portanto, todos os motivos apresentados fazem com que dólares saiam ou até mesmo não cheguem ao Brasil, diminuindo a oferta deste ativo no mercado nacional e consequentemente aumentando seu preço.
Entretanto, a desvalorização cambial também gera impactos em diversas cadeias de mercado no Brasil. Em relação ao café, como consequência, pode-se destacar dois impactos principais: a melhora da competitividade do café brasileiro no mercado internacional, pois, com o câmbio elevado, o produto torna-se mais barato no mercado externo; e o aumento nos custos de produção, pois diversos componentes como fertilizantes, herbicidas, inseticidas, combustível, peças, dentre outros, estão diretamente relacionados ao dólar e ao mercado internacional. A Figura abaixo mostra um índice com a variação nominal média do dólar, do preço da saca de 60kg de café arábica, dos preços das toneladas dos fertilizantes ureia, superfostato e cloreto de potássio, e do preço do litro do herbicida à base de glifosato, entre os anos de 2010 até o mês de março de 2020, para o preço da saca de café, e o mês de janeiro de 2020, para os preços dos insumos. Portanto, em todos os anos em que o aumento dos preços do dólar e dos insumos foram maiores que do preço da saca de café, o produtor teve seus custos pressionados. Isso aconteceu pela última vez em 2019 e pode acontecer novamente este ano, apesar da melhora dos preços do café nos últimos meses.
Figura – Índice de preços do dólar, café, ureia, cloreto de potássio, superfosfato simples e glifosato entre 2010 e fevereiro/março de 2020.
Como é possível perceber, existe uma relação direta entre o dólar e os preços dos insumos (correlação de 0,85, 0,95, 0,74 e 0,90, respectivamente, entre o dólar e os preços dos insumos ureia, superfosfato, cloreto de potássio e glifosato), mas não foi observado uma relação tão forte entre o dólar e o preço do café arábica nos últimos dez anos (correlação de 0,55). Apesar disso, entre 2019 e 2020, é possível perceber uma recuperação dos preços do café em comparação aos demais insumos, registrando um aumento de 19,1%, ante uma valorização do dólar (12,3%), redução nos preços dos fertilizantes (-4,1%, -1,0% e -1,8%, respectivamente, para ureia, superfosfato e cloreto de potássio) e aumento no preço do herbicida à base de glifosato (3,9%). Mesmo quando analisado apenas a média dos primeiros meses de 2020 com os mesmos meses de 2019 (janeiro à março para o preço médio do dólar e do café e apenas janeiro para os insumos), o aumento do preço do café (26,8%) foi superior à valorização do dólar (16,5%) e dos insumos (ureia – 1,7%, superfostato – 1,8%, cloreto de potássio – 0% e glifosato – 5,9%). Vale ressaltar que, é possível que os preços desses insumos se acelerem nos próximos meses de informações (fevereiro e março), captando a alta valorização do dólar nas últimas semanas.
Previsões do Banco Central brasileiro mostram que o dólar deve permanecer em patamares elevados nos próximos anos, sendo cotado a R$4,50 ao final de 2020, ainda um pouco acima da média para este ano até o momento (R$4,43), mas abaixo da cotação das últimas semanas (acima de R$5,00). Portanto, espera-se que o mercado de café brasileiro continue atrativo para os consumidores internacionais e os produtores brasileiros ganhem competitividade no mercado internacional, aumentando as exportações e a renda dos produtores nacionais, e pressionando os preços do café para cima no mercado interno. Apesar disso, o cenário de câmbio desvalorizado pode tornar os custos de produção de café maiores, sem uma recomposição proporcional do preço da saca, reduzindo a margem dos produtores e deteriorando as relações de troca entre o café e os insumos diretamente relacionados ao dólar.
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